Ofir e Társis: O Comércio de Salomão com os Confins da Terra
I. Um Mapa de Mitos e Mercadorias
O mapa intitulado “Ofir e Társis” conduz-nos aos confins do mundo conhecido na Antiguidade. Esses dois nomes, frequentemente encontrados na Bíblia, evocam imagens de riquezas incomparáveis, viagens oceânicas arriscadas e alianças comerciais intercontinentais. Mas onde ficavam Ofir e Társis? O que eles representavam para os antigos hebreus? E por que aparecem associados ao rei Salomão e à era de ouro de Israel?
Este artigo explora o significado histórico, geográfico e teológico desses dois lugares enigmáticos, cruzando dados bíblicos com fontes arqueológicas e linguísticas, à luz do mapa que os apresenta como pontos nodais de comércio e imaginação bíblica.
II. Ofir: A Origem das Riquezas de Salomão
1. Referências Bíblicas a Ofir
Ofir aparece várias vezes na Bíblia como uma terra rica em ouro e outros recursos valiosos. A menção mais destacada ocorre durante o reinado de Salomão:
“Porque o rei tinha no mar uma frota de Társis com a frota de Hirão; de três em três anos vinha a frota de Társis, trazendo ouro, prata, marfim, bugios e pavões.”
— 1 Reis 10:22
Ofir é especificamente ligado ao ouro:
“E veio para Salomão ouro de Ofir, em grande quantidade.”
— 1 Reis 9:28
2. Onde Ficava Ofir? Hipóteses Geográficas
A localização de Ofir é tema de intenso debate. As principais propostas incluem:
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Sul da Arábia (atual Omã ou Iêmen) — ligação com os sabeus e minas antigas.
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Costa oriental da África (Somália, Eritreia ou Zimbábue) — pela presença de ouro e rotas comerciais africanas.
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Índia ou Sri Lanka — possível explicação para os "pavões" e especiarias mencionadas nas cargas.
O mapa “Ofir e Társis” normalmente representa Ofir no Oceano Índico, acessível por rotas marítimas via o mar Vermelho e o Golfo de Áden, indicando a amplitude do comércio israelita no século X a.C.
III. Társis: Um Porto nos Confins do Mundo Ocidental
1. Társis na Bíblia Hebraica
Társis também é um local mencionado com frequência na Bíblia, e frequentemente com aura de distância mítica. É o destino para onde o profeta Jonas tenta fugir:
“Jonas se levantou para fugir da presença do Senhor, para Társis.”
— Jonas 1:3
Társis é associada ao comércio marítimo:
“As naus de Társis cantavam de alegria.”
— Isaías 2:16
“Társis negociava contigo por causa da abundância de todas as tuas riquezas; com prata, ferro, estanho e chumbo davam as tuas feiras.”
— Ezequiel 27:12
2. Possíveis Localizações de Társis
A identificação mais comum liga Társis à cidade de Tartesso, no sudoeste da Península Ibérica (atual Espanha). As razões são:
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Conhecimento fenício do Mediterrâneo Ocidental.
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Existência de minas de prata, estanho e chumbo na região da Andaluzia.
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Registros arqueológicos de comércio entre Tiro e o sul da Ibéria no final do segundo milênio a.C.
Alternativamente, Társis poderia ser:
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Cartago (norte da África).
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Sardenha ou Chipre.
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Um nome genérico para destinos marítimos distantes.
O mapa “Ofir e Társis” normalmente mostra Társis no extremo oeste, além do Estreito de Gibraltar, enfatizando que para os hebreus, Társis era literalmente o fim do mundo conhecido.
IV. A Frota de Salomão: Aliança com Hirão de Tiro
1. Parceria Israelita-Fenícia
Durante o reinado de Salomão, houve uma aliança com Hirão, rei de Tiro (1 Reis 9:26–28). Tiro, uma potência marítima, fornecia:
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Navegadores experientes.
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Navios e portos na costa fenícia (moderna Líbano).
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Acesso às rotas comerciais do Mediterrâneo.
Salomão construiu uma frota em Eziom-Geber, no Golfo de Ácaba, e de lá as embarcações navegavam para Ofir.
2. Um Ciclo de Comércio de Três Anos
A Bíblia menciona que os navios levavam três anos para completar suas viagens, sugerindo distâncias vastas e paradas em vários portos. As mercadorias trazidas incluíam:
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Ouro de Ofir — símbolo de pureza e prestígio.
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Prata e pedras preciosas.
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Marfim, macacos e pavões — produtos típicos de regiões tropicais, como a África Oriental ou Índia.
Esse ciclo marítimo reflete uma era de expansão comercial, rara na história de Israel, impulsionada pela estabilidade política, os tributos recebidos e o apoio fenício.
V. Significado Econômico e Teológico de Ofir e Társis
1. Riqueza e Centralização em Jerusalém
Os produtos exóticos e metais preciosos vindos de Ofir e Társis eram usados por Salomão para:
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Decorar o Templo do Senhor.
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Construir palácios e edifícios monumentais.
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Sustentar uma corte luxuosa.
Essa centralização de riqueza refletia a glória do reino davídico, mas também gerou tensões sociais, como mais tarde se expressaria na divisão do reino.
2. Imaginário Profético e Escatológico
Ofir e Társis não ficaram restritos ao mundo econômico. Os profetas também os utilizaram em imagens escatológicas:
“E enviarei sobreviventes... até às ilhas remotas que não ouviram a minha fama... até Társis, Pul e Lude.”
— Isaías 66:19
“Trazendo ouro e prata... da terra de Ofir, ao nome do Senhor teu Deus.”
— Isaías 60:9
Esses locais distantes simbolizam as nações sendo atraídas para Jerusalém na era messiânica.
VI. Fontes Arqueológicas e Debates Modernos
1. Mineração Antiga e Comércio
A arqueologia confirma o comércio antigo de metais preciosos:
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Minas de ouro e cobre foram encontradas no deserto da Arábia e Sudão.
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Evidências de comércio fenício com o Ocidente (inclusive com a Ibéria) são abundantes.
2. Debates Sobre Literalidade
Alguns estudiosos interpretam Ofir e Társis como:
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Locais reais, acessados por meio de redes comerciais amplas.
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Conceitos simbólicos, usados para expressar a grandiosidade do reino de Salomão.
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Mistura de mito e realidade, como eram comuns na cartografia do mundo antigo.
O mapa “Ofir e Társis” é, portanto, ao mesmo tempo um instrumento de geografia bíblica e uma projeção de uma cosmologia teológica: Israel no centro e as riquezas das nações convergindo para Jerusalém.
VII. O Horizonte do Mundo Bíblico
O mapa de “Ofir e Társis” representa mais do que uma geografia antiga: ele revela os horizontes do imaginário bíblico. Os hebreus do Antigo Testamento viam-se no centro de uma rede de povos, mares e reinos, com Ofir e Társis simbolizando os extremos oriental e ocidental do mundo conhecido.
Ofir, com seu ouro, e Társis, com seus navios longínquos, permanecem como ecos da glória de Salomão e das possibilidades infinitas da exploração humana. Para os profetas, eram também visões do futuro: tempos em que os confins da Terra reconheceriam o Deus de Israel.
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