Samaria: A Queda da Capital de Israel diante do Império Assírio (722 a.C.)
I. Samaria no Centro da História de Israel
O mapa intitulado “Samaria” nos leva ao coração político e espiritual do Reino do Norte de Israel entre os séculos IX e VIII a.C. Fundada por Onri, pai do rei Acabe, Samaria foi não apenas capital administrativa, mas também um símbolo do poder israelita no cenário geopolítico do antigo Oriente Próximo.
No entanto, Samaria também se tornaria sinônimo de decadência religiosa, alianças políticas perigosas e ruína nacional. O acontecimento histórico mais marcante associado ao nome dessa cidade é a sua destruição pelo Império Assírio em 722 a.C., um evento com repercussões duradouras para o povo hebreu e para a teologia bíblica.
II. Fundação de Samaria: A Capital de Onri e Acabe
1. O Rei Onri e o nascimento da cidade
De acordo com 1 Reis 16:24, o rei Onri comprou o monte de Semer e ali construiu uma nova capital:
“Comprou de Semer o monte de Samaria por dois talentos de prata; e edificou nele uma cidade...”
A cidade foi nomeada Shomron (Samaria), tornando-se capital do reino do norte por aproximadamente 150 anos.
2. Samaria sob Acabe
Seu filho, Acabe, casado com Jezabel, princesa fenícia, fortaleceu Samaria:
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Ergueu palácios e fortalezas (1 Reis 22:39).
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Introduziu o culto a Baal, provocando o confronto com o profeta Elias.
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Estabeleceu alianças políticas e militares com Tiro e Damasco.
Samaria, nesse tempo, tornou-se uma cidade cosmopolita e poderosa — mas também alvo das críticas proféticas por idolatria e injustiça social.
III. O Declínio do Reino do Norte
1. Alianças e Guerras com a Assíria
A partir do final do século IX a.C., o Império Assírio se expandia agressivamente. Israel oscilava entre alianças e rebeliões:
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Menaém (c. 752 a.C.) pagou tributo ao rei assírio Tiglate-Pileser III (2 Reis 15:19–20).
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Pecá aliou-se a Damasco para resistir à Assíria, mas foi derrotado.
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O último rei, Oseias, inicialmente submisso à Assíria, tentou uma aliança com o Egito — uma decisão fatal.
“O rei da Assíria descobriu conspiração em Oseias, pois este tinha enviado mensageiros a So, rei do Egito...”
— 2 Reis 17:4
2. Cerco e Queda de Samaria
Em resposta à rebelião de Oseias, o rei assírio Salmaneser V cercou Samaria por três anos (c. 725–722 a.C.). O cerco terminou sob o reinado de Sargão II, que completou a conquista:
“No ano nono de Oseias, o rei da Assíria tomou Samaria, e levou Israel cativo...”
— 2 Reis 17:6
O reino de Israel foi destruído, e grande parte da população foi deportada para regiões da Mesopotâmia, como:
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Halá
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Habor (perto do rio Gozã)
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Cidades da Média
Este evento marca o fim do Reino do Norte e o surgimento da chamada “diáspora das dez tribos perdidas”.
IV. A Teologia da Queda: A Causa Espiritual da Ruína
Os autores bíblicos interpretam a queda de Samaria como consequência da infidelidade religiosa:
“Assim aconteceu porque os filhos de Israel pecaram contra o Senhor seu Deus... temeram outros deuses... e adoraram os ídolos.”
— 2 Reis 17:7–12
As práticas condenadas incluem:
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Idolatria e sincretismo.
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Sacrifício de crianças.
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Alianças com nações estrangeiras em vez de confiar em Deus.
A queda de Samaria tornou-se um paradigma de julgamento divino. Os profetas como Oséias e Amós denunciaram a corrupção e a opressão social da elite samaritana:
“Ai dos que vivem sossegados em Sião, e dos que estão confiantes no monte de Samaria...”
— Amós 6:1
V. Consequências da Queda de Samaria
1. A política de deportação assíria
Sargão II implementou a política assíria de deportação e reassentamento:
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Os israelitas foram removidos.
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Povos de outras regiões (como Cuta, Ava, Hamate e Sefarvaim) foram trazidos para a região.
“O rei da Assíria trouxe gente da Babilônia, de Cuta, de Ava, de Hamate... e os fez habitar nas cidades de Samaria em lugar dos filhos de Israel.”
— 2 Reis 17:24
Esse processo criou uma população mista que, nos séculos seguintes, seria chamada de samaritana, dando origem ao antagonismo entre judeus e samaritanos no período do Novo Testamento.
2. Sobrevivência e assimilação
Alguns israelitas permaneceram na terra, casaram-se com os povos estrangeiros, e formaram uma nova identidade religiosa híbrida. Esses samaritanos manteriam práticas mosaicas, mas com diferenças importantes:
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Templo no Monte Gerizim em vez de Jerusalém.
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Pentateuco samaritano como escritura sagrada.
VI. Descobertas Arqueológicas em Samaria
A cidade de Samaria tem sido extensivamente escavada. As descobertas incluem:
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Palácio de Onri e Acabe, com fundações impressionantes.
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Placas de marfim luxuosas, compatíveis com o "palácio de marfim" citado em 1 Reis 22:39.
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Pinturas e inscrições assírias que confirmam o cerco de 722 a.C.
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Inscrições de Sargão II registrando a conquista de Samaria e a deportação de 27.290 pessoas.
Essas descobertas comprovam o alto grau de sofisticação da cidade e a veracidade histórica do cerco assírio.
VII. A Memória de Samaria no Pensamento Bíblico
1. Samaria como símbolo de apostasia
Os profetas usaram Samaria como símbolo de idolatria e punição:
“Samaria será desfeita, como a espuma sobre a superfície da água.”
— Oséias 10:7
2. Comparação com Judá e Jerusalém
Embora Judá tenha durado mais tempo, os profetas alertavam que o mesmo destino de Samaria poderia ocorrer com Jerusalém se não houvesse arrependimento.
“Viste o que fez a rebelde Israel?... E Judá, sua irmã pérfida, foi pior.”
— Jeremias 3:6–11
3. O Novo Testamento e a Reconciliação com os Samaritanos
Nos Evangelhos, Jesus atravessa Samaria e dialoga com os samaritanos:
“Senhor, vejo que és profeta...” — João 4:19, disse a mulher samaritana.
A parábola do bom samaritano (Lucas 10) também reabilita a figura do povo samaritano, antes visto com desconfiança.
VIII. Samaria como Símbolo da História Bíblica
O mapa “Samaria” representa muito mais do que uma cidade em ruínas. Ele remete a:
- Um auge político durante a era de Onri e Acabe.
- Um colapso trágico diante da maior potência do mundo antigo, a Assíria.
- Um marco teológico, interpretado como consequência da infidelidade espiritual.
- Um ponto de origem de um novo grupo religioso-cultural: os samaritanos.
A destruição de Samaria em 722 a.C. encerra uma era, mas inaugura um novo capítulo na história do povo hebreu — um capítulo de diáspora, memória e reconstrução de identidade.